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Cancer Bucal

Cancer Bucal

26/02/18 - Odontologia

CANCER DE BOCA

Ao contrário de certas neoplasias malignas que só se tornam perceptíveis ao atingir grandes extensões, o câncer é passível de ser detectado tanto pelo paciente, através do auto-exame, como pelo profissional dentista durante o exame clínico de rotina, viabilizando-se, assim, o diagnóstico precoce e o tratamento com o mínimo de seqüelas. O diagnóstico precoce do câncer bucal interfere de forma decisiva na efetividade dos recursos terapêuticos e no tempo de sobrevida do paciente. Quando a neoplasia da cavidade da boca é detectada em sua fase inicial, o índice de sobrevida aumenta de forma considerável. O diagnóstico na fase inicial da doença, combinado com um tratamento adequado, parece ser o método mais eficaz para o controle do câncer bucal.

No Brasil, 50 a 60% dos pacientes com câncer de cabeça e pescoço comparecem para a primeira consulta sem possibilidades de tratamento cirúrgico, restringindo, assim, a utilização de uma das armas mais eficientes no tratamento desta doença.

 

A American Cancer Society estima que para tumores menores que 1,5cm de diâmetro a taxa de sobrevivência em cinco anos é de 59%, enquanto para tumores maiores de 3,0cm esta taxa é apenas de 17%. Além disso, o preço pago pelos pacientes que conseguem sobreviver é a mutilação, na grande maioria das vezes com seqüelas difíceis de serem solucionadas em curto prazo, dificultando com isso a reintegração social do paciente.


CONCEITOS

Tumor pode ser empregado para designar qualquer proliferação ou crescimento anormal de tecido seja ela benigna ou maligna.
Neoplasia é conceituada, pela maioria dos tratados de patologia, como sendo uma massa anormal de tecido, sem nenhum propósito e autônoma, cujo crescimento ultrapassa os limites dos tecidos normais, e persiste, da mesma maneira excessiva, após a cessação dos estímulos que produziram a mudança.
Tumor benigno é uma proliferação anormal e ilimitada de células (neoplasia), semelhantes as do tecido de origem, que permanece restrita ao seu local de origem, ou seja, não invade e nem destrói o tecido normal vizinho e também não se espalha para locais distantes do corpo. Exemplos: papiloma, fibroma, lipoma etc.
Tumor maligno refere-se à proliferação anormal e ilimitada de células (neoplasia), diferentes das células de origem, capaz de invadir, tanto o tecido normal circunvizinho destruindo-o, como se espalhar pelo corpo através do sistema circulatório ou linfático (metástases).
O termo câncer é a tradução latina da palavra grega carcinoma que significa: crustáceo, caranguejo. Foi usado pela primeira vez por Galeno (138-201 DC) ao observar um tumor de mama feminina; a deformidade e o intumescimento das veias da região causado pela doença era de tal ordem que lembrava, de forma figurada, a imagem de um caranguejo.

 

EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER BUCAL

Morbidade
O câncer bucal é o sexto tipo de câncer mais comum em todo mundo com uma participação aproximada de 6% dos casos de câncer diagnosticados anualmente. A taxa de incidência desta doença vem caindo em alguns paises, mas apresenta uma grande variabilidade mundial, sendo quase o dobro em paises desenvolvidos em relação aos paises em desenvolvimento.

 

Mortalidade
Com relação à mortalidade, os dados mais recentes disponibilizados pelo Ministério da Saúde indicam que no ano de 2002, 13% dos óbitos em geral ocorreram por conta das neoplasias malignas, ou seja, 128.162 mortes. A categoria câncer de lábio, cavidade oral e faringe teve uma participação de 4% em relação aos óbitos por neoplasia malignas totalizando 5.100 casos.    

Gênero
Existem diferenças marcantes na incidência do câncer bucal segundo o gênero, sendo o masculino o mais afetado. Em paises em desenvolvimento, esse tipo de câncer representa o quinto mais freqüente na população masculina, e o sétimo na feminina. No sul da Ásia, é o primeiro câncer em incidência entre os homens. Estimativas do INCA para o Brasil em 2005 apontam que o câncer bucal deverá ser o 6o câncer mais freqüente no homem e o 8o na mulher.

Mundialmente, a razão de gênero é de 2:1, enquanto que na América do Sul essa razão é de 3:1. No Brasil, com relação ao gênero verifica-se uma razão de 2,6 casos em homens para 1,0 caso em mulheres. No passado, esta relação já foi bem maior atingindo uma proporção ao redor de 5:1. Atualmente, verifica-se um estreitamento dessa relação, é provável que isto se deva a incorporação, pelas mulheres, de certos hábitos que eram um “privilégio” dos homens, como o fumo e o álcool.

Idade
O fator idade é fundamental no estudo do câncer bucal, uma vez que aumenta as possibilidades de contato e o tempo de exposição aos agentes carcinogênicos a medida que o indivíduo avança em idade.

 

O câncer, em geral, é uma doença de meia-idade e idade avançada, sendo raro nas crianças e adultos jovens. No Brasil, ao se analisar a distribuição por faixa etária, verifica-se que sua concentração está acima dos 40 anos. No Estado de São Paulo, numa série histórica de 1975 a 1984, a análise dos coeficientes de mortalidade por câncer bucal ajustados pela mortalidade geral, revela que a faixa etária de maior percentual (15,16%) foi a de 50 a 54 anos, seguida pela de 55 a 59anos, com 13,66%.

 

Pesquisas realizadas nesse campo levam a acreditar que no futuro poderá haver uma ampliação das faixas etárias para os casos de câncer bucal no Brasil, em particular em São Paulo, por se tratar de uma cidade de alto risco em relação aos agentes carcinogênicos.

 

As neoplasias malignas da cavidade da boca continuam sendo mais freqüentes na quinta e na sexta década de vida, mas, têm mostrado uma tendência de crescimento em idades menos avançadas. O câncer da cavidade oral e da faringe em adultos jovens, até 40 anos, apresenta prognóstico ruim, com uma média de sobrevivência de 3 anos em 17% dos casos.

 

CARCINOGÊNESE

 

O câncer é uma doença multifatorial, na verdade o seu aparecimento depende da interação, durante um período de tempo variável, de uma série de fatores, alguns de natureza genética, outros ambientais. Os estágios mais importantes desse processo são: a indução, promoção e a progressão.

 

Na fase de indução ou iniciação, as agressões promovidas pelos carcinógenos primários são dirigidas contra o DNA genômico acarretando alterações das bases que formam esta estrutura, levando a mutações gênicas. As células cujo material genético foi alterado passam a receber instruções erradas para as suas atividades. Essas alterações gênicas ocorrem pela ativação dos proto-oncogenes em oncogenes e inibição de genes supressores de tumor, em especial o p53, responsável pela estabilidade genômica, controle da proliferação celular, reparo do DNA e apoptose. Este evento de indução se processa de forma rápida, tem caráter irreversível e é dose dependente, embora sem um limiar mensurável.

 

Na fase de promoção os carcinógenos secundários ou oncopromotores atuando sobre a célula induzida incrementam a proliferação celular – este aumento da atividade pode fazer com que se alterem outros mecanismos da função celular como a diferenciação -, a célula mutante então é transformada em célula maligna de forma lenta e gradual. Para que estes fenômenos aconteçam, é necessário um tempo relativamente longo, pois a repetição ou a continuidade da exposição ao agente, é essencial, embora não tenha um caráter cumulativo. Caso haja a interrupção da exposição, o processo torna-se reversível, ou seja, cessando os estímulos à proliferação, diminuem as possibilidades para que ocorra a transformação celular, uma vez que em situação de não divisão, o DNA é bastante estável. No entanto, ao se reproduzir, a célula previamente induzida, pode desrespeitar pelo menos alguns dos controles reguladores de crescimento que operam as células normais dos tecidos, como resultado, surgirão células com uma maior autonomia, que seletivamente superam suas progenitoras, podendo dar origem a um clone de células neoplásicas com potencial invasivo e metastático.

 

Na fase de progressão, é quando ocorre a transformação maligna propriamente dita, este estágio se caracteriza pela multiplicação descontrolada e irreversível das células alteradas. A taxa de crescimento acelerada e a autonomia crescente dessas células fazem com que o tumor cresça por infiltração progressiva, invada e substitua os tecidos de áreas subjacentes, não reconheça os limites anatômicos das estruturas e pode ainda, por disseminação linfática, sangüínea ou mesmo pelos espaços perineurais, provocar neoplasias a distância, formando as metástases e eventualmente levar o indivíduo à morte.

 

Os fatores de natureza física, química ou biológica que tenham potencial para provocar alterações no genoma ou incrementar a proliferação celular são denominados de carcinógenos ou cancerígenos. Estes podem ser classificados como iniciador, se causa dano genético nas células, e promotor, se estimula a taxa de crescimento celular. São denominados de carcinógenos completos, se atuam, de forma conjunta, como iniciador e promotor.

 

Contrapondo-se às agressões, existem mecanismos naturais de defesa que protegem o indivíduo evitando a ocorrência de doenças, inclusive os cânceres. Na grande maioria das vezes, as alterações celulares produzidas ao longo da vida do indivíduo são interrompidas ou, até mesmo, se o dano for significativo, a célula alterada é eliminada. Os mecanismos que concorrem para esse feito e que variam de indivíduo para indivíduo são: a integridade do sistema imunológico, a capacidade de reparo do DNA danificado por carcinógenos, e a ação de enzimas responsáveis pela transformação e eliminação de substâncias cancerígenas. Havendo a supressão de algum desses mecanismos, implica num aumento do risco de câncer.

           

PRINCIPAIS AGENTES CARCIOGÊNICOS RELACIONADOS AO CÂNCER DE BOCA

FUMO
A relação entre o tabaco e o câncer foi estabelecida há mais de 200 anos, sendo hoje considerado como o principal agente carcinogênico, que pode aumentar sobremaneira o risco do indivíduo aos cânceres de pulmão, laringe, cavidade oral, faringe, esôfago, pâncreas e bexiga.

 

O tabaco é um carcinógeno completo, porque tanto tem a capacidade de lesar o DNA celular, através das substâncias genotóxicas produzidas pela sua combustão, induzindo a efeitos mutagênicos, como estimula a proliferação celular pela sua ação irritativa. Já foram identificadas no tabaco e na fumaça que desprende dele por volta de 4.700 substâncias tóxicas, das quais 60 apresentam ação oncogênica conhecida, dentre elas, os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, isolados das fases gasosa e particulada do fumo, os quais se constituem num dos principais elementos com poderes carcinogênicos indutores. Além desses, as nitrosaminas voláteis e aromáticas, formadas através de aditivos químicos na cultura do tabaco e no ato de fumar também exercem ações carcinogênicas.

 

Com relação ao câncer bucal, há que se destacar, ainda, o efeito promotor da injúria térmica provocada na mucosa oral decorrente da combustão do tabaco, principalmente nos fumantes de cachimbo, cigarro de palha e naqueles que tem o hábito de fumar invertido (Cachimbo Indiano). Embora, no Brasil, o hábito de fumar invertido não seja comum, constata-se em populações que adquiriam esse hábito um aumento na incidência de leucoplasia em palato e câncer na mesma região – a brasa do cigarro pode atingir 884o C e a sua proximidade com a mucosa oral causa danos significativos. Também deve ser considerada nesta questão a injúria mecânica derivada do atrito constante do papel, estrias da palha e boquilha do cachimbo na semimucosa labial.

Álcool
A maneira como o álcool atua na produção do câncer não está completamente esclarecida, no entanto, é indiscutível que esta substância desempenha uma ação irritativa local pelo contato direto do etanol e seus metabólitos, os aldeídos, com a mucosa oral, estimulando a proliferação celular. Os efeitos indiretos provocados pelo álcool, também têm sido estudados na carcinogênese, em especial o imunossupressor e o nutricional, este último conseqüente da cirrose hepática e da subnutrição comuns nos indivíduos alcoólicos, os quais se refletem na constitucionalidade dos tecidos deixando-os mais frágeis e vulneráveis às ações dos carcinogênicos.

 

A concentração do álcool nas bebidas fermentadas é menor que nas bebidas destiladas. A cerveja apresenta cerca de 5% de álcool, a cachaça 50%, o whisky 40%, o vinho 18%. Portanto, bebedores de cachaça possuem maior risco de dano celular que os bebedores de cerveja. O alcoólatra em relação aos pacientes que bebem ocasionalmente possui 15 vezes mais risco de aparecimento de câncer de boca.

 

Há alguns anos os epidemiologistas verificaram que a associação do hábito de fumar e ingerir bebidas alcoólicas aumenta o risco do desenvolvimento do câncer bucal, ou seja, pior que o efeito carcinogênico isolado promovido pelo álcool ou pelo tabaco, é a associação dessas substâncias. Estima-se que quando o álcool e tabaco estão associados, o risco relativo é potencializado, em até 141,6 vezes mais, quando o consumo dessas substâncias é alto e prolongado.

Radiações
A radiação ionizante é um dos carcinógenos que tem a propriedade de lesar diretamente o DNA celular, induzindo a mutações gênicas, levando a transformação celular.

 

A radioatividade decorrente de explosões nucleares constitui-se num sério risco à humanidade, haja vista os efeitos devastadores ocasionados na população de Nagasaki e Hiroshima, por ocasião da explosão da bomba atômica.

 

A radiação solar, embora não ionizante, desempenha um importante papel carcinogênico para os casos de câncer de pele e lábio, em especial naqueles indivíduos de pele clara. Sabe-se que os raios médio ultravioleta (UVB), componentes dos raios solares, cujo comprimento de onda oscila entre 290 a 320 nanômetros, têm ações eritematosas, congestivas e carcinogênicas.A exposição repetitiva ao sol sem a devida proteção pode, depois de 15 a 30 anos, ou até menos, levar ao aparecimento de lesões hiperqueratóticas, que podem desenvolver câncer de pele e na semimucosa de lábio inferior.O uso de protetores solares e a não exposição ao sol entre as 10h e 16h, período onde há uma grande concentração desses raios, constituem-se formas elementares de prevenção ao câncer de pele e lábio inferior .

Vírus
Diversos vírus já foram sugeridos como portadores de potencial oncogênico, destacando-se dentre eles o vírus do herpes simples (HSV) e mais recentemente o vírus do papiloma humano (HPV). Embora não haja comprovação para se afirmar que exista esta associação, colecionam-se indícios de que o HPV pode desempenhar um papel importante na carcinogênese bucal principalmente quando associado a outros fatores como o fumo, álcool e imunodeficiências.

 

Sabe-se que o HPV replica-se na camada basal do epitélio e o acesso para esta região mais profunda é feito através de lesões e/ou abrasões que ocorrem na superfície epitelial. Embora mais de 100 tipos de HPV já tenham sido identificados, os tipos 6, 11, 16 e 18 são os apresentam uma maior relação com a carcinogênese. A ação dos HPV 16 e 18, por exemplo, está associada às oncoproteínas E6 e E7, as quais agem seqüestrando e degradando proteínas supressoras de tumor como a p53 e a pRb, respectivamente.

 

FATORES DE RISCO RELACIONADOS AO HOSPEDEIRO

 

Fatores genéticos
O estudo do fator genético envolvendo o câncer de boca é pouco discutido na literatura. 

 

No entanto, quando há história familiar de câncer, os fatores genéticos devem ser considerados como os mais prováveis responsáveis pelo risco. Esses fatores quando associados aos hábitos de vida, como o tabaco e o álcool, podem interagir e aumentar o risco para o câncer bucal. A grande dificuldade dos estudos é conseguir separar a influência da hereditariedade e dos fatores ambientais compartilhados.

Estado nutricional
Deficiências nutricionais constituem fator importante na ocorrência de câncer bucal.

 

Um dos indicativos de qualidade de vida é sem dúvida o grau de nutrição. Uma alimentação balanceada, isto é, equilibrada nos seus constituintes energéticos, construtores e reguladores, é fundamental para uma vida saudável. O excesso, a falta ou defeito no metabolismo de qualquer nutriente seja carboidrato, lipídio, proteína, vitamina ou mineral, pode ser prejudicial ao organismo, podendo levar a alterações constitucionais dos tecidos, deixando-os mais susceptíveis à ação dos carcinogênicos.

 

Estudos têm comprovado que de 2 a 5% do oxigênio que respiramos se transformam em radicais livres, e estes têm sido implicados com diversas doenças degenerativas, inclusive o câncer. As únicas substâncias que podem quebrá-los são as vitaminas E, C e betacaroteno, por este motivo o consumo de verduras e frutas cítricas tem sido recomendado na prevenção do câncer.

Imunodeficiências
Estudos têm apontado, que o estado de imunodeficiência está relacionado com o aumento de ocorrência de câncer de uma maneira geral. É antiga a citação da literatura, que pacientes submetidos a transplantes de órgãos, e por conseqüência, medicados por longo tempo com drogas imunossupressoras, têm risco aumentado para desenvolver cânceres, inclusive da cavidade bucal. Com o aparecimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), tem-se constatado que cerca de 4% desses pacientes desenvolvem carcinoma espinocelular na boca, o que é significativamente maior do que o risco da população, que está em torno de 0,008%. O sarcoma de Kaposi, neoplasia maligna rara, que se origina a partir das células endoteliais, teve a sua incidência bastante aumentada com o advento da AIDS, onde 30% dos pacientes desenvolvem este tumor, sendo que a metade dessas lesões se expressa na cavidade bucal.

 

OUTROS FATORES DE RISCO

Condições cancerizáveis
Condição cancerizável, é sempre relativa a uma situação sistêmica. Essas alterações aumentam o risco do indivíduo ao câncer bucal, quer pelas suas características de promover uma redução das defesas imunológicas do indivíduo, como as relatadas nas imunodeficiências, ou por fragilizar os tecidos induzindo alterações na mucosa bucal, em especial as atróficas, como acontece nas deficiências nutricionais tanto por carência como por defeito no metabolismo, nas anemias, na diabetes etc...

Lesões cancerizáveis
São alterações do tecido que podem se transformar em tumor maligno a qualquer momento, mas que podem permanecer no estágio não maligno por um tempo indefinido, e até mesmo nunca se transformar, principalmente se for evitado estímulos nocivos sobre o tecido já doente.

 

Fonte: Livro -     Estomatologia, bases do diagnóstico para o clinico geral.

                             Autor Sergio Kignel

                             Capitulo 15 autores : Paulo José Bordini

                                                                    Sanny Fabretti Bueno Grosso

                                                                    Soraya Carvalho da Costa